quarta-feira, 29 de julho de 2015

Leve, mais leve

Os meus check-ups trimestrais estão a tornar-se mais leves, se bem que não ainda ao nível da pena ou do algodão. Ontem recolhi sangue para análises, marcador inclusivé. Hoje voltei lá para o raio-X ao tórax e ecografia abdominal.

Já sei que aparentemente está tudo bem, apesar de oficialmente só ter os relatórios daqui a 3 dias. O Doutor Vieites Branco, o médico da imagiologia que me segue desde o início, já não me chama de “menina da mastite carcinomatosa” (= cancro inflamatório ). Apenas D. Vera agora. Como é bom não ter rótulos J

O facto de agora só ir lá uma vez por mês a consulta de oncologia e limpeza também me fez perder prioridade nas boxes e no atendimento. Faz todo o sentido que assim seja e que seja assim por muiiiiiiiito tempo. Desta vez, penso que pela primeira vez comecei a sentir que já não quero pertencer aquele sítio, se é que alguém quer. Senti-me já uma “estranha”, que se sentou num dos cadeirões ao lado da janela, tirou sangue, limpou catéter e foi embora.

Vi tantas vezes isto acontecer da minha box. Pessoas que entravam, faziam qualquer coisa rápida e iam embora com a mesma pressa que todos temos na vida. E eu estava ali horas a fio agarrada à droga (literalmente), saindo apenas para ir à casa de banho e mesmo assim acompanhada pelo carrinho sexy dos sacos da quimio.

Ontem retraí quando a enfermeira me espetou o cateter. Devemos encher o peito de ar e estar o mais quieto possível para a enfermeira acertar à primeira no “buraco” do cateter. Claro que o movimento fez com que doesse bem mais e pisasse a zona envolta. Não sei porque raio tive aquela reação, mas a enfermeira Maria José, sempre uma querida e sempre atenta, disse-me baixinho que a minha reação era normal quando se chega a esta fase. Estamos fartos de ser picados…e aquela agulha de cateter faz-me lembrar da quimio, o sítio cheira a quimio e vi sacos de quimio a passar à minha frente.
Eu ri-me e disse-lhe que já estou farta de agulhas, ora no peito, ora na barriga. Vão lá espetar outra, se faz favor!

A consulta com o meu oncologista correu às mil maravilhas. Como eu admiro este senhor. Por entre conversa sobre férias, filhos e netos, ele vai metendo umas perguntinhas isoladas e vai aferindo assim sobre o meu estado de saúde, sem me perguntar diretamente se sinto/tenho alguns sintomas de recidiva. Claro está que eu o entendo e agradeço o gesto, se bem que eu os conheço quase de cor e salteados. Acho que puxando bem pela imaginação, até os consigo sentir….mas só na imaginação.


Dores e incómodo é só mesmo nas articulações, inchaços e retenção de líquidos e ainda algum cansaço, mas a hormonoterapia tem destas coisas.  Enquanto for só assim, estamos bem, muito bem.

Aproveitem as férias para descansar, ler e estar com quem vos faz bem.
Bjinho
Vera


terça-feira, 21 de julho de 2015

Injustiça, ou teria mesmo de ser?

Não sei se sabem, mas o cancro irrita-me solenemente. É matreiro, estúpido e mete-se com pessoas boas, más e assim-assim. Mete-se com todas as que quer, na verdade. Um verdadeiro "gigolô".

Fiquei triste com a morte da Ashleigh. Triste por ela, pelo marido e dois filhos, um de 2 anos e outro com 1 aninho apenas. Era uma pessoa de fé, com um ar feliz e pacífico, mesmo na dor de um cancro terminal. Foi diagnosticada com cancro inflamatório durante a gravidez do segundo filho e tentou de tudo. Não conseguiu vencer este cancro, mas lutou de uma maneira que poucos saberão fazer. 

No seu percurso, conseguiu juntar esforços para levar ao conhecimento público mais informação sobre este tipo de cancro, trazer uma maior consciência às grávidas de que as alterações do peito nem sempre são só relacionadas com a gravidez e ainda angariou fundos para a investigação.

Se foi uma injustiça, ou se teria mesmo de ser assim?
Não me compete a mim julgar, mas se me dessem voz, eu diria que sim, que foi injusto. Que o critério de seleção foi mal aplicado e que se corrija o erro e a devolva à família. 

É, por vezes, assustador seguir esses grupos de apoio. Vemos tombar, quase numa base semanal, pessoas com as quais eventualmente já trocámos ideias, impressões, sofrimentos. Vemos igualmente o outro lado. Pessoas que foram diagnosticadas há anos e têm vencido todas as expetativas médicas e pessoais e fazem os "caloiros" do grupo ganhar esperança e seguir-lhes o exemplo.

Para mim, esta relação tem sido sempre benéfica. Aprendi a respeitar a vida, a reproximar-se dos meus e a viver intensamente - não necessariamente sempre em festa :)

Deixo-vos um discurso que a Ashleigh fez, antes de saber o que lhe estava destinado, porque bons exemplos e lições de vida nunca são demais.






quinta-feira, 16 de julho de 2015

Falta justificada

Lembrou-me uma certa pessoa, há dias, que eu já não escrevia há muito tempo no blog. Ainda há uma leitora fiel...ehehehehe.
Realmente, acho que desde o primeiro post a 14 de janeiro de 2014 (quando ainda se escrevia janeiro com J maiúsculo) que não deixava passar assim tanto tempo entre desabafos.

Esta minha falha está associada a vários fatores:

- CANSAÇO - tenho andado mais cansada. Penso que o calor agora me atinge mais do que antes, com a hormonoterapia ando mais sensível às variações de temperatura (e ainda mais refilona);

- COMPROMISSOS -na ânsia de viver, de fazer o que no ano passado me estava proibido, tenho andado a 500 kms/hora. É fins de semana na serra, é na praia, é com amigos, enfim....é um sem fim de atividade.

- RITA - esta minha filha é um espetáculo, mas não uma "stand-alone show woman". Adora companhia, brincar e ler, cantar e dançar com a mãe. Não troco esses momentos por nada.

Eu não me esqueço do blog, foi aqui que muitas vezes vim desabafar, porque há coisas que se dizem melhor na escrita, especialmente para quem fala muito, sobre tudo e todos, menos de si mesmo. Não posso mentir e dizer que nunca me passou pela cabeça terminar o "desencontros". Se deus quiser, este meu desencontro da vida fica por aqui, mas ainda não me sinto preparada para abandonar o blog, acho que ainda me é útil. E é porventura útil a quem me segue, ou a novas "marias" que se encontrem no início do ciclo.

Tenho seguido e tentado ajudar algumas "marias" no início desta viagem. Dar apoio, confortar e aconselhar as pessoas que, por uma via ou outra, chegam até mim, tem-me feito bem.

Bjinhos e continuem aí.
vera

PS. Daqui a 2 semanas, novo check-up. Mau humor e irritabilidade a caminho!!