São 8h da manhã, sábado dia 15. Devia estar a
dormir como qualquer pessoa normal, ou como qualquer pessoa anormal que levou
doses de quimioterapia na quinta e sexta-feiras. Devo estar na fronteira entre
o normal e o anormal.
A Rita veio infiltrar-se na cama dos pais às
7h, com aquele jeitinho pouco bruto (‘Mamã, deixa passar!’) e que convence
qualquer um a ceder-lhe o lugar. Mas não posso culpar a criança, eu já estava
acordada. Supostamente, disse o meu oncologista, ia dormir a tarde toda ontem e
hoje ia dormir imenso, nem ia dar pela noite a passar. Errado. Não consegui
dormir ontem de tarde, nem dormi que nem um calhau de noite.
Aparentemente, apanhei uma dose de
anti-histamínicos bastante forte, de modo a evitar fazer alergia ao Docetaxel e
ao Herceptin, as minhas novas drogas. Estava bastante apreensiva. Caso fizesse
alergia, não poderia seguir este plano terapêutico que melhor se adequa e
melhores resultados apresenta para o meu cancro.
Na quinta-feira a enfermeira Maria José estranhou-me assim que entrei na “box”. “Você hoje está muito agitada”, dispara ela assim que me viu. Já lidou com uma imensidão de doentes de cancro, aprendeu a ler-lhes os olhos e a postura física, bem como o estado mental.
Claro que ela tinha razão. Estava ansiosa, com
a perspetiva de mais 12 sessões a agitar-me a alma. É complicado não se ver um
fim, saber que ainda faltam 12 semanas para, espero eu, se poder começar a
pensar na cirurgia. E digo espero, porque se não estiver ainda operável, terá
de se pensar noutra estratégia.
Decidi que não posso pensar na cirurgia
durante esta fase. Claro que o que eu decido, nem sempre acontece, daí também
parte da minha agitação. Sei o que vai acontecer, independentemente da redução
do tumor que se consiga e nessa altura, além das dores físicas, sei que outras
surgirão.
Todos me aconselham a ter calma, a levar um
dia de cada vez. Mas um dia de uma pessoa com cancro é diferente dos outros.
Não me arrelia deixar a louça por lavar, ter a sala desarrumada ou ter um prazo
para cumprir. Arrelia-me, sim, não conseguir levar este barco da melhor maneira
possível, não saber lutar contra uma coisa que nos vai assombrar para o resto
da vida.
Passada a primeira parte desta nova quimio, o
meu querido oncologista pediu-me para fazer uma ecografia ao peito. Como
sempre, tratou de tudo e 1 hora depois da quimio, já estava a entrar na
radiologia. Ele próprio quis falar com o radiologista e ver as imagens. E
quando ele me diz ”Vera, estou bastante contente com a redução. Nunca pensei
que já estivesse assim, mas ainda temos muito a fazer.” Fiquei aliviada,
surpreendida e acima de tudo, mais calma.
Ontem, já antes de entrar para a segunda parte
da quimio, levantei as análises ao sangue, que revelaram que o marcador tumoral
também baixou quase para metade. É um alívio grande, apesar de reconhecer que
ainda tem de baixar muito mais! Mas está a descer e é a isso que tenho de me
agarrar.
Fiz a segunda parte da quimio com menos
agitação, com o oncologista a espreitar a minha “box” muito frequentemente, com
medo da reação alérgica. Até ele estava agitado, preocupado. Costumo dizer que
ele foi um anjo que me apareceu e realmente deve ser. Uma preocupação com os
pacientes que vai além do valor monetário e que nos faz sentir “cuidadas” e não
só mais um doente canceroso a tratar.
Também me sossegou o facto de o meu seguro ter
aprovado parcialmente este novo tratamento. Parece que há seguros que não
aceitam de bom grado mudanças a meio do plano e que não gostam de aprovar
medicamentos tão caros como o Herceptin. Claro que provavelmente vou estoirar o
plafond antes de chegar à cirurgia, mas tenho de me preocupar com uma coisa de
cada vez e, neste momento, tenho de me concentrar em reduzir o bicho,
alimentar-me adequadamente e descansar para o corpo poder recuperar. O sistema
imunitário começou a dar sinais de fraqueza na 4ª sessão da outra quimioterapia
e por isso tenho de me “pôr fina”. Preciso que o corpo aguente todas as sessões
semanais, para não haver interrupções e assim será.
Ao Miguel Morais e Ana Maria da Universidade de
Aveiro, força companheiros de luta.
Em breve, a Dª Manuela (bar da reitoria)
servir-nos-á um belo cházinho para comemorarmos a saída desta fase menos boa!
Obrigado a todos os que me acompanham nesta luta, de uma maneira ou outra contribuem para a minha esfera protetora.
Bem haja a todos. Muita saúde.
Vera q consigas viver um dia de cada vez com muita calma e muito amor , isso sei q tens de quem te rodeia ... daqui um xi <3 apertadinho desejando
ResponderEliminarq tudo o q esperas se concretize :-)