quarta-feira, 19 de março de 2014

Desmaterializar

Por norma, custa-me desligar de certas coisas, e quando digo coisas, são coisas mesmo!

A infância não foi, por certo, das mais abastadas. Viviam-se tempos complicados, família a viver de uma agricultura de susbsistência pouco rentável e com o atraso inerente (e apenas mais tarde aceite) ao facto de viver numa pequena aldeia das serras de Vale de Cambra. Costumo dizer que o alcatrão chegou lá bem depois de mim, já tinha o meu irmão mais novo 6 anos. Frequentei a tele-escola (coisa que mais tarde reparei ser rara em pessoas da minha idade) e madruguei anos seguidos para poder apanhar o único autocarro que nos levava à escola secundária, na então vila de Vale de Cambra.

Talvez por isso me tenha sempre agarrado às coisas que ia conquistando e que nunca me foram oferecidas de bandeja. Ao primeiro carro, comprado com as poupanças do ano de estágio, às primeiras roupas de marca, à primeira casa...enfim, a todos os primeiros que vamos conquistando.

E quando um cancro nos abala, nos faz sentir mais do que meras coisas, aprendemos a viver com o que temos e a desprender-nos do que não precisamos para sermos felizes.

É este o processo que sinto e vivo neste momento. Não preciso do meu traje académico a ocupar espaço no armário, para me lembrar dos tempos em que vestia o 32 e passeava orgulhosamente o mesmo pela cidade. Preciso, sim, de me lembrar como fui feliz com o traje, como nos lembraremos de ser chamadas de pinheirinhos de natal numa noite em Coimbra, como nos ajudávamos a vestir umas às outras para irmos todas charmosas! Preciso das memórias, não preciso do traje.

E tal como o traje, não preciso de guardar as imensas coisas que comprei quando a Rita nasceu, até porque as probabilidades de ter um segundo filho estão, neste momento, quase equiparadas a ganhar o euromilhões.

Ovos, alcofas, carrinho, berço, máquinas para esterilizar, cadeira da papa, parque, marsúpio, espreguiçadeira, etc etc...comprámos tudo o que achava ser o melhor para a Rita. Agora, vendo bem, vejo que se gasta imenso dinheiro com o primeiro filho:)

Só que neste momento, apenas me enche a garagem e um dos quartos da casa da minha sogra. A utilidade destas coisas cá em casa ou na minha sogra é perfeitamente nula.

Sendo assim, criei assim um segundo blog, o http://libertar-a-garagem.blogspot.pt/
Vou postando as coisas à medida que for fotografando. Para os mais incrédulos com esta minha atitude, despreocupem-se. Ainda não estou assim tão desesperada por dinheiro. Só preciso de desmaterializar.

Obrigada por partilharem.
Bjinho




1 comentário:

  1. Olá Vera, leio as tuas palavras e sinto exactamente o mesmo.....esta vida é tão curta, aprendemos a lutar para "ter" as nossas coisas(o que é bom, mas....), compramos montes de coisas, e depois....levamos uma pancada da vida e, damos conta que afinal as "coisas" que queríamos tanto, que eram preciosas, afinal, são secundárias.....eu, deixei casa, deixei conforto, deixei tudo, meti o essencial na mala, trouxe o puto e o marido e rumámos Africa....e sabes de uma coisa? estas pessoas vivem com tanto pouco...e andam sempre na festa!!!são felizes. dá uma certa "inveja" da ligeireza com que levam a vida, sem pensarem que amanha será novo dia, será mesmo que amanhã é um novo dia??????bjs, muita força, tudo de bom, Carla Carmo

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