quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

5ª feira

A quinta-feira é para mim o chamado "turning point", depois de mais uma sessão de quimio.
Na terça, lá fui eu à 4ª e última do 1º ciclo de quimioterapia.

Desta vez, um motorista diferente. O meu irmão mais velho levou-me, ao passo que o irmão mais novo ficou a tomar conta e lidar com a Ritinha. Os irmãos podem ser muito chatos, especialmente quando somos uma teenager inconsciente a querer sair à noite e o mais velho quer proteger-nos dos bichos papões todos deste mundo e do outro! Os irmãos mais novos também conseguem ser uma pedra no sapato quando querem, uns chatos :)

Mas, quando o mundo entra em sintonia, os irmãos podem ser os nossos melhores amigos e companheiros de luta. A eles, o merecido obrigado!

Hoje, como estava a dizer, é o "turning point" do meu estômago. O dia a seguir à quimio é marcado por um cansaço extremo, dores no corpo e vontade de silêncio. Dois dias depois, i.e. hoje, apetece-me inverter o efeito de gravidade que o meu estômago parece ganhar.

Mas nada posso fazer, a não ser contar os dias e esperar acordar no sábado mais bem disposta e com um sol lindo.

O que atenua estes efeitos?

Receber umas flores, a vizinha (e amiga) que me visita diariamente e traz sopinha fresca, uma amiga que vem fazer o almoço, chocolates vindos da Alemanha, Nelson & Risy a full-time cá em casa para o que der e vier, o Nuno que finalmente regressou de viagem e uma menina linda que diz que a mamã está bonita com o cabelo pequenino!

Beijinhos :)

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Maturidade

Por vezes espanto-me com a maturidade que a minha filha demonstra, nos seus tenros 3 anos e meio. Espero sinceramente que seja maturidade, e não dor ou confusão naquele cérebro tão produtivo e inquieto.

Quando me sinto melhor, abuso um bocadinho na tentativa de regressar à tal normalidade que todos gostamos. Um jantar maravilhoso ontem, na companhia de duas amigas de há anos e respetivas famílias em Cantanhede. Luísa e Lurdes, duas pessoas que conheci quando cheguei a Aveiro em 1998 e que em muito facilitaram a minha vida cá.

Hoje rumámos a Vouzela, almoçar a casa dos pais do Nuno e apreciar as evoluções de um projeto do pai do Nuno que envolve um quarto cor de rosa com brilhantes :)

Claro que a "noitada", a viagem e o dia-a-dia normal me cansam. Mas não foi o cansaço que me levou a precisar de deitar depois do almoço. São as benditas injeções de fatores de crescimento :)
Tornozelos, joelhos, bacia e coluna....tudo se ressente com esta "preciosidade" que vai ajudar a minha medula a manter os glóbulos em valores normais. 

Estava deitada na cama e a Rita a brincar com a avó Alice. Numa tentativa de evitar que a Rita de 5 em 5 minutos viesse ao quarto, a avó disse-lhe que a mamã precisava de descansar, porque estava doente.  A Rita responde simplesmente à avó: "Eu sei que a mamã está doente. Eu sei de tudo avó!"

Com esta sinceridade nua e crua, apercebemo-nos que a sensibilidade e atenção de uma criança aos pormenores e conversas dos adultos deve ser levada mais em conta! 

Beijinhos :)





sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Normalidade


Estou em reclusão social há quase 2 meses. Para quem me conhece minimamente, sabe que (tirando a quimio), é isso que me custa atualmente.

Não poder levar a Rita ao CIAQ, dizer bom dia e conversar com as colaboradoras do nosso infantário. Ver a Rita entrar na sala diariamente e ser bem recebida pelos amigos é um bálsamo diário tão bom para o coração.

Não poder ir trabalhar para a universidade, partilhar da “euforia” do Horizonte 2020 e saber que por lá já se esforçam em dobro para manter a honra da casa. Saber que em breve temos uma revista a sair, um Research Day em grande e não vou poder viver isto, que tanta adrenalina boa nos dá.

O simples facto de não poder estar com pessoas normalmente, ir a um café ou almoçar fora com o meu charmoso,  sem o medo de um vírus, bactéria ou qualquer treta do género.

Mas hoje regressei a uma normalidade “forjada”. 

Como o Nuno estava pela capital, fui levar a Rita à escolinha. Revi muitos sorrisos e palavras de incentivo das colaboradoras do CIAQ e senti-me quase “normal”.

Fui ao centro de saúde pedir a minha Junta Médica, porque como me disse uma amiga: já que tens cancro, aproveita os benefícios fiscais! Acho que preferia pagar impostos a dobrar...aliás, acho que o Passos Coelho já implementou essa medida para todos, doentes ou não!

A quimioterapia tem-me tirado muita coisa. A normalidade das nossas vidas é julgada com muita leviandade e desprezada em quase todos os momentos da nossa vida. Até que alguém liga um interruptor e lá se vai essa normalidade tomada como garantida.

Hoje no centro de saúde, as duas funcionárias que me atenderam simpaticamente (é esse o efeito de um lenço na cabeça ou uma peruca), quase se pegavam por um pormenor burocrático...palavras agressivas, olhares torcidos e eu pasmada a olhar para as duas. Valerá a pena isso?

Se temos de passar o dia todo com alguém, num espaço confinado, não será racional e inteligente tentar manter uma cordialidade e um ambiente agradável?

Esta minha postura não adveio do cancro, note-se. Já partilhei espaços , conversas, jantares, etc., com pessoas com as quais não criei, nem criarei jamais, empatia. Mas maltratar e ser mal-educado parece-me tão mal. Mas, não quero dar lições de moral a ninguém.

Prosseguindo com a normalidade, fui às compras, porque aqui em casa a despensa estava em crise. Claro que ir às compras, no meu caso, é aqui ao supermercado mais pequeno em Ílhavo, a uma hora em que os velhotes andam a escolher maçãs, mas é o mais seguro.

E ainda trabalhei (de casa), fiz uma torta de doce de abóbora e preparei o jantar, hoje com convidados muito importantes, a Sandra e o João. Medalhões de pescada com beringela (em cama de legumes e creme de soja) no forno! Arriscar um prato de peixe para o João (vulgo Moebios) é dose! Mas ele gostou...os outros comem qualquer coisa J

Convidar pessoas cá para casa sempre me deu muito prazer. Gosto de ter a casa movimentada e com este casal amigo há sempre boa disposição.

E a boa disposição, comida na mesa e amigos trazem de volta dos dias de normalidade. 

Beijinhos :)

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Força de vontade


Recebi ontem um livro intitulado 'Força de vontade', por James Patterson e Hal Friedman. É uma história de luta, não contra cancro, mas contra um síndroma que não é tão "famoso" como o dito cujo.

Interessa reter a força de vontade, a esfera protetora que esta criança teve, quando as probabilidades estavam contra ela.

 O meu obrigado à D. Alda e a Celina por mais este mimo :)
Assim ainda me estragam....


A luta verídica de uma família contra um mistério clínico agonizante.
Uma história de triunfo contra todas as expectativas.
Um relato poderoso sobre o poder do amor e da determinação.

Uma manhã, quando tinha quase cinco anos, Cory Friedman acordou a sentir uma vontade incontrolável de abanar a cabeça. A partir desse dia, a sua vida transformou-se numa agonia de tiques irrefreáveis e involuntários. Cory embarcou então numa odisseia que se prolongou por treze anos, de tratamento em tratamento, à procura de uma luz ao fundo do túnel.
Cory, a quem foi diagnosticado a síndrome de Tourette, viveu longos anos sob um regime médico duro e em permanente mutação que o deixou a sentir-se como uma verdadeira cobaia. Rapidamente passou a ser a ser difícil distinguir os tiques sintomáticos da sua doença dos que eram efeitos secundários das inúmeras combinações de medicamentos a que foi sujeito ao longo da sua penosa caminhada pela infância e adolescência. A única certeza de Cory era a de que continuava a piorar. Mas com o amor da sua família e o apoio de alguns professores e profissionais dedicados, Cory lutou pela sua vida e alcançou feitos incríveis em que poucos apostavam.
Força de Vontade é a história verídica e emotiva da batalha de Cory pela sobrevivência, contra as maiores adversidades. Escrito por James Patterson e pelo pai de Cory, Hal Friedman, com o ritmo absorvente de um thriller, é o relato comovente da coragem, determinação e triunfo final de uma família a braços com uma situação desesperante.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

De volta às teclas...


Já se passaram uns bons dias desde que me aventurei na escrita, na resposta às inúmeras mensagens e tentativas de contacto. Acreditem que eu, mais do que ninguém, o lamento.  Lamento não responder, não poder dar atenção a quem me quer bem, mas esta terceira quimio deixou-me ko.

Há que admitir os factos. Desta vez, ela levou a melhor. Conseguiu colocar o meu estômago em lugares fisicamente impossíveis (ex. na garganta) e o meu nariz hiper apurado! O meu querido oncologista já me havia dito que a toxicidade ia permanecendo no corpo e me ia “assombrar” um dia destes. Pois, bem, já deu o ar da sua graça e não é NADA divertido.

Felizmente ontem já acordei melhor e hoje espero ter um bom dia.
E tive, de facto,  um bom dia na terça, quando fui com a minha querida Sisse (Sandra para os comuns mortais) ao Hospital da Arrábida levar mais uma dose.

Chovia torrencialmente em Ílhavo quando ela me veio buscar. Aqui por casa, o meu irmão já estava cá para tomar conta da pestinha júnior, porque o Nuno estava em Madrid. Lá foram as madames, serenas e seguras, tirando a chuva e fraca visibilidade, mas os carros que a Sandra conduz são verdadeiros “estiques” (quem dos tempos de estágio não se lembra de empurrar o Peugeot 205?).

A sessão começou com um sorriso de orelha a orelha e olhos semi-molhados (há que manter a aparência de dureza!). Ao que parece, anda por aí um grupo de meninas que resolveu me presentear com uma coisa simples, mas que me fez sentir muito, muito acarinhada. Meninas e menino, um menino que eu nunca julguei fazer estas figurinhas...mas que com isto me deu uma das maiores provas de amizade que já recebi. Love you back carecão J

Já ouviram falar dos calendários da Pirelli? Aquelas modelos todas xpto? Pois bem, nada disso no calendário que me ofereceram. Apenas fotos de pessoas que se preocupam comigo e vale muito, muito mais do que imagens de siliconadas J



Uma mensagem pessoal a todas as minhas modelos do calendário:

Janeiro – Lurdes: o ar pacífico que transmites na foto em África do Sul, teu país natal, é fantástico. Sentes-te em casa J
Sofia: sempre com um ar calmo, a transmitir uma serenidade que te foi sempre inerente
J

Fevereiro -  Eliane & Laura: a tua filha é muito, muito mais bonita do que tu J Adorei o pormenor das T-shirts iguais com a mensagem.

Março – Rita Pessoa: esta foto está fantástica mesmo. Até a enfermeira soltou uma gargalhada quando a viu. Obrigado pela mensagem forte. Sabes do que falas e isso significa muito.

Abril - Daniela: minha algarvia emprestada favorita. Obrigada pela sms logo de manhã. Voltarei à tua serra assim que estiver recomposta. Adoro a Serra da Estrela no Verão J

Maio - a minha Rita: é o mês da minha menina. Fotos lindas dela que vocês arranjaram.

Junho - Andreia: minha estrangeira favorita. Essa tua terra natal um dia ainda vai conhecer os meus olhos verdes. Espero que estejas bem.
Susana LB: Acabaste de ser mãe e ainda assim arranjaste tempo para me mandares uma mensagem. O José Pedro nem sabe o que lhe calhou na rifa J

Julho - Frô, nosso Paulinho e Joana: que foto linda dos três.  Trilhamos muitos caminhos juntas, rimos, choramos e vamos vencendo as batalhas. É assim mesmo. Um beijo forte para a tua mãe.

Agosto - Katrin: tão perto aqui de casa e com as nossas vidas agitadas, ainda não conheço a tua filha. É linda como o pai!

Setembro – Sandra e João:  estou(supostamente) interdita de mostrar esta imagem, mas ADOREI. Tive de olhar umas 500 vezes para conseguir acreditar que alguém fez esta figura. Sandra, de ti espero tudo mesmo, mas dele foi mesmo inacreditável. Adorei, do fundo do coração J

Outubro - Rita Pessoa- Mais uma vez, uma foto que mostra a garra e determinação com que persegues os teus objetivos. O pinheiro nem sabe com quem se meteu...ehehehe
Troubles: tu sabes que eu não gosto de gatos, tenho alergia a gatos e só de pensar em gatos fico com comichão. Mas obrigada pela mensagem no Scrables. Foi com algum trabalho que escreveste em inglês, mas está muito bom.
Joana Porto:  quem diria que não gostas de aparecer em fotos e ias mandar a foto de um gato! Sim, onde está o bicho...o bicho está a levar porrada, pena é que eu também apanho!

Novembro - Joana Velho: a pacífica, a senhora que me traz o churrasco do Ribeirinho e vem almoçar comigo, nos dias em que pres(sente) que estou sozinha. Energias positivas sim, sempre. Churrasco também J

Dezembro - um apanhado de bons tempos. Fotos daqueles jantares de curso no Café Convívio (febras com cogumelos...), dos tempos de Erasmus na Alemanha, do diploma nas mãos e de carinhas tão novas e cheias de esperanças e ingenuidade própria da idade.

Bem, como o ano só tem 12 meses, a mensagem final que me deixaram, resume tudo o que me quiseram transmitir. Obrigada a todas, adoro-vos J

"What Cancer Cannot Do"
Cancer is so limited...


It cannot cripple love.

It cannot shatter hope.

It cannot corrode faith.

It cannot destroy peace.

It cannot kill friendship.

It cannot suppress memories.

It cannot silence courage.

It cannot invade the soul.

It cannot steal eternal life.

It cannot conquer the Spirit.

Author: Unknown



terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Dia normal



Poderia classificar dia de hoje como dia D!
- O dia em que decidi cortar o cabelo curto, porque me irritava perder o cabelo aos bocadinhos  (até a Rita se queixava do cabelo no sofá e na cama).
- O dia em que se comemora a luta contra o cancro.
- O dia em que fui ao Porto de peruca e ela não voou com o temporal.
- O dia em que fui tirar sangue para um estudo genético, estilo Angelina Jolie (só me falta o Bradzito).

Pois, poder até podia. Mas prefiro dizer-vos que foi mais um dia normal, dentro da normalidade dos dias de uma pessoa que tem cancro e se vê forçada a quebrar todas as rotinas que tanto adoramos. 

Preparei a minha filha para ir para a escola, despedi-me do charmoso e dela. Li emails, liguei para o trabalho, descobri que um pirata maluco atacou um site de um projeto e tentei organizar algumas coisas em atraso para uma famosa revista que tem de sair antes de Junho.

De tarde, chegou o meu cabeleireiro e a sua assistente (Nelson & Risy), conforme combinado previamente. Senti que estava na altura de cortar. Sempre vai cair, por isso cortamos antes que eu ganhe uma hérnia na coluna a apanhar cabelo do chão. Para ser sincera, não me custou, talvez pelo ambiente familiar. No meio da minha sala, com um plástico no chão e com a Risy a assistir. Acho que o que me assustou mesmo foi a ideia de o meu irmão se vingar na minha pobre cabecinha, depois de a Risy quase lhe ter tirado o escalpe.

Estamos os dois quase “lindos”. Só espero que  a moda não pegue. É que o dia de hoje não foi muito propício a cortes destes, com o vento a assolar as pobres orelhas.  Este parvo rapou o cabelo em solidariedade (e pela calvície primária nada própria dos “Matos”). Não se pode dizer que ele fique mais bonito do que eu, certo?


Foi um gesto muito bonito. Acho que agora sim, posso dizer que te perdoo little brother por me teres feito chichi na cara quando tinhas uns meses de idade!

Bem haja a todos pelas manifestações de carinho J
Vera