segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

NED

Há dias na vida dos "sobreviventes oncológicos" em que a incerteza, o medo de recidiva paira no ar, talvez por estar a aproximar-se a altura dos exames de rotina trimestrais... e, estranhamente recebemos nesse dia um email de uma norte-americana que, entre outras coisas, diz o seguinte:

"I got my original diagnosis nearly 26 years ago on 14 March 1991 and have been NED ever since"

e pensamos que também merecemos isso, caramba.


Bjinho a todos e menos azedume, porque afinal é quase Natal.


segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Memórias & rosas


No domingo deparei-me com imensas memórias soltas de pessoas que fizeram parte do meu passado. Fez, na semana passada, 9 anos que o meu pai faleceu. A missa de aniversário da sua morte era este domingo, pelas 10h45 na aldeia dos meus pais. Claro está que não cheguei a horas decentes, mas não foi só nesta. Acho que só fui à do 1º ano, as outras tenho escapado, quiçá evitado.

Não gosto deste tipo de aniversários, não gosto do que me lembra, não gosto das falsidades que costumam advir nestes dias. Por isso, há que preservar a devida distância para manter a minha sanidade mental. Não mais frequentes são as idas ao cemitério…mas sim, passei por lá este domingo para deixar umas rosas na campa onde estão os meus avós maternos e pai. Deixámos as rosas, falei com a Rita sobre eles e ela tentou ler os nomes nas campas. Fez perguntas simples, mas pertinentes….”se o teu avô se chamava Brandão, porque é que a tua avó é Almeida…e o teu pai não tem Almeida no nome, porque é que tu tens e eu não tenho? Com quantos anos morreram? A tua avó era mais velha que o teu avô?” e por aí em diante…

No seguimento, na tentativa de deixar uma rosa numa outra campa, corremos o cemitério à procura dessa pessoa. Não a encontrei, mas estranhamente apercebi-me que muitas pessoas que fizeram parte da minha vida já ali jazem…acho que mais de metade da minha aldeia está ali. E entre campas, flores e uma curiosidade inata da Rita, fui-lhe dizendo o que fazia um e outro, histórias e estórias engraçadas de cada um. As histórias do Tio Zé (marido da Tia Silvina) e do Tio Fernandes, que na sua linguagem própria, contavam as fábulas e histórias de La Fontaine e Perrault, provavelmente sem nunca ter ouvido falar dos seus autores. Eram ótimos contadores de histórias e tinham ótimas memórias dos tempos idos. Vi os vizinhos dos meus pais, vizinhos dos meus avós, tios e tias sem laços de sangue, que numa aldeia são partilhados pelas crianças.

Enquanto falava com a Rita, e o Nuno acelerava para a porta do cemitério, pensava para comigo o que ia ser da aldeia daqui a uns anitos…os mais velhos estão a morrer e os novos vão fugindo. Contra mim falo, saí em 1998 para estudar em Aveiro e por aqui fiquei e dificilmente me voltaria a adaptar a viver lá longe de tudo e de todos os que fui integrando na minha “família” em Aveiro.

Depois do cancro, aproximei-me mais da aldeia e das coisas da aldeia. Estamos a plantar um pomar lá e lentamente a tentar cuidar melhor do que temos por lá. No domingo plantámos mais árvores de fruto. Falta ainda preparar o terreno para as chuvas, mas o tempo não estica. Vamos fazendo, vamos cuidando, porque agora tem de ser tudo feito com ponderação, não vá o braço se armar em esquisito. Aceitam-se voluntários, no entanto. No Verão, já houve por lá uma alentejana a regar árvores a balde, quiçá na próxima jorna haja mais algum voluntário para as limpezas do terreno?

Uma coisa é certa. Trabalhar ali cansa o corpo, mas com a Serra da Freita no plano de fundo, não pensamos naquelas coisas que nos azedam diariamente. Mens sana in corpore sano.

Foto: ADCRA Viadal

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Os 36 bem saboreados!

É verdade, aparento 25, mas já cá cantam 36 :)

Faz hoje 36 anos que esta bela donzela nasceu lá nas encostas da Serra da Freita. Tive um dia estranhamente agitado, para um suposto dia de folga de aniversário. Analisemos:

1- Comecei por ir fazer análises ao sangue, que exigem sair de casa em jejum e ter de aturar o estômago aos berros até poder comer;

2- Seguiu-se uma ida às Finanças, coisa que recomendo que todos façam no seu dia de aniversário;

3- Almoço com a filhota, que estranhamente, escolheu o MacDonald's...andei empanturrada até quase à noite....aquilo não é comida, é entulho, mas enfim, de vez em quando tem de ser para a criança não pedir para mudar de família :);

4- Café com D. Alda e filha, coisa que já não fazia há uns belos tempos. Já me cheirava a marosca, mas...

5- Ecografia com um médico muito, digamos, pouco ortodoxo. Perguntou-me porque uma bela jovem como eu estava a fazer uma ecografia à tiróide....mas sim, a beleza tem destas coisas...acho que tanta quimio me tornou mais jovem e luminosa :)

6- Sessão de Fisioterapia, porque com a mudança de estação/ tempo, o meu braço ficou meio "empenado" e a corda da viola saltou...(piada só para entendidos).

7- Comprar um bolo na Galeota, porque há uma chata na reitoria que se fartou de pedir bolo. Não o consegui fazer, por isso lá fui eu comprar...ficas a dever-me os 10€ do bolo, loirinha!

8- Encontrar-me à pressa com prima chata e Francisca linda para me dar os parabéns.

8- Jantar com a Rita e Charmoso..e sim, a nossa ementa de aniversário foi batata cozida e carapau grelhado com molho verde. Muito requintados :)

9- Mega-surpresa cá em casa, com a D. Alda e Ana sempre por detrás do acontecimento...mãe e Álvaro, little brother e Risy, D. Helena, vizinhança, representantes dos Beans, enfim...dei por mim a receber várias rosas de todos...muitas brancas, as minhas favoritas. MUITO OBRIGADA A TODOS.

10- Terminada a festa, fazer trabalhos de casa com a Rita e deitá-la...estava ko, coitada!

10- Nos entretantos deste dia longo, atendi imensas chamadas e "likei" muitas mensagens no Facebook. Obrigada a todos, seja por sms, facebook, skype, etc...perderam um bocadinho do vosso dia comigo, obrigada. Ainda falta devolver umas quantas chamadas...amanhã, ok?



É por estas e por outras que a vida faz tanto sentido.

Se todos dermos um bocadinho, recebemos muito. Hoje recebi muito carinho e agradeço a  todos por isso e por estar aqui para poder apreciar a vossa companhia. Que eu tenha saúde para poder estar aqui a celebrar com os meus amigos e família por longos anos.


Beijinho
Vera


quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Por caminhos incertos, à procura de certezas...

Hoje olhei para trás...tive de o fazer e...caramba, que caminho tenho trilhado desde finais de 2013. Estou cansada só de o ter de relatar, nas mais variadas formas...biópsias, análises ao sangue, Tac's, RMN's, cintigrafias, Rx's, ecocardiogramas, ecografias, mamografias, densitometrias...Ca 15.3 para trás e para a frente...aliás, sempre para baixo, felizmente.


Ando há 2 semanas a preparar o meu processo clínico em formato digital para envio para o que os seguros chamam de Segunda Opinião Médica (Ask Best Doctors). Nunca poderei, na minha vida, falar mal do meu seguro de saúde ( a não ser quando descontam as mensalidades dos 3). Tem sido um fiel amigo e apesar de ter tido de suportar várias franquias agravadas, o certo é que o seguro sempre foi suportando as contas mais pesadas.

Nesta fase deste meu "desencontro", esbarrei novamente na incerteza e no medo de não estar a fazer as melhores escolhas. Consultei, até ao momento, dois médicos diferentes, em hospitais diferentes na área da cirurgia reconstrutiva. Claro está que não me podiam facilitar a vida. Deram-me dois caminhos diferentes, opiniões contraditórias e eu baralhei-me ainda mais.

Estou a par de tudo o que envolve reconstrução de uma mama. Sei quais os métodos, quais as recomendações, quais as taxas de complicação em cada método...não fosse eu quase médica destas andanças:) Só não sei qual o melhor para o meu caso.

Pensava que sabia, estava convencida que ambos os cirurgiões plásticos iam dizer a mesma coisa:
 "D. Vera, como fez muita radioterapia, não poderá fazer A nem B, apenas o C."
...e eu apenas confirmaria o meu "veredito caseiro". Mas não, eles tinham de inventar e baralhar este meu cérebro.Um disse para fazer o A, o outro o C ou talvez mesmo o D.  Isto são apenas letras a marcarem métodos, nada que ver com copas, não se baralhem.

E a Vera perguntou...então e se eu quiser fazer X, o que acha? E "prontes" um diz que sim, outro diz nem pensar. E entenderem-se, não? Dizerem a mesma coisa a alguém que anda à procura de certezas?
Falei com as minhas amigas americanas, há de tudo por lá também, mas a maioria recomenda apenas 1 dos métodos e costumam estar sempre bem informadas e aconselhadas.

Resumindo, 2 semanas a compilar digitalmente o meu processo clínico, aquele lindinho organizado com separadores...entre scans, downloads,  renomear ficheiros e organizar fotos, perdi algumas horas. Não fiz o meu processo completo, apenas pontos-chave no tratamento e enviei ficheiro com 150Mb para a seguradora.

Agora, depois de conversar com a enfermeira e de ela organizar a informação, o processo seguirá para um especialista, para emissão de relatório acerca do meu caso e das minhas dúvidas existenciais. Deve seguir para os Estados Unidos, segundo me disseram. Espero que venha um relatório assertivo e com o preto no branco.

Entretanto, vou esperar com calma. É uma coisa que não me tira o sono, tira-me mais a paciência mesmo, porque não gosto de incertezas ou dúvidas. Se não estiver certa do que devo fazer, adio.

Até aos 90 anos tenho tempo!

Beijinho


segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Chegou o outubro rosa!

Sim, dizem que é o mês rosa, mês da chamada de atenção e afins para o cancro da mama. Um mês que as pessoas que já tiveram cancro de mama sentem de forma mais intensa, mais dolorosa. Para mim, não há outubro rosa, todos os meses são meses rosa. Todos os meses sinto o laço rosa (quase à volta do pescoço).

As marcas físicas estão muito presentes. O cateter ainda está aqui no peito disponível para uso e o processo de "mentalização" para a reconstrução aviva memórias e sentimentos.

E este sentir pode ser tão somente recordar. Recordar que há 2 anos estava esturricada da radioterapia e as cicatrizes estavam tão frescas ainda. Fisicamente estava um trapo, foi muita quimio, cirurgia, radioterapia, imunoterapia e hormonoterapia... tantas terapias que qualquer coisinha me punha cansada e qualquer tentativa de me concentrar em algo útil saía frustrada.

Passados 2 anos, ainda não me sinto a mesma pessoa, aliás nem poderia sentir. O Tico e o Teco sofreram bastante e ainda hoje sinto as sequelas...memória de "Dóri", concentração dificultada, incapacidade de engolir muitos sapos ou guardar rancores mesmo quando me apercebo que me estão a prejudicar...esta se calhar já tinha antes da quimio :)

Quem ouve as palavras "tens cancro", jamais pode voltar a ser a mesma pessoa. E ainda bem...quem consegue sair dele, vive mais desprendido, mais feliz e mais rosa...rosa por todo o lado, mesmo quando o mundo à nossa volta teima em ser mais para o negro, quando as contas se acumulam ou quando vês pessoas boas de coração sempre aflitas e as más sempre na mó de cima.

No fundo, o outubro rosa devia ser uma chamada de atenção, mas com tanta falta de informação que tenho visto, mesmo em pessoas ditas letradas, não sei se 1 mês por ano é suficiente para esta tarefa herculiana.

Ao não esconder, ao partilhar desde o início, vou ajudando a espalhar a palavra, pelo menos relativamente ao cancro inflamatório da mama, desconhecido inclusivamente na comunidade médica. Já tive de explicar a vários profissionais de saúde o que era o cancro inflamatório e já levei respostas do género "oh menina, inflamatórios são todos, porque o cancro envolve inflamação"...E não, não lhe fui às trombas, pacificamente mandei-o ir ao Santo Google. Para quê ensinar quem não quer aprender?

Prevenir é sempre o melhor remédio...vigilância, alimentação, hábitos saudáveis e pouco rancor e azedume nas nossas vidas. O cancro não escolhe idade, sexo, raça, cor de cabelo ou altura...escolhe-te a ti quando quiser, quando lhe apetecer. Se puderes não contribuir para este hóspede indesejado, tanto melhor.

Sejam felizes e larguem os rancores e as amarguras. Tornam-nos ácidos por dentro, literalmente. E imaginem quem adora ambientes ácidos??

Beijinho

Vera


terça-feira, 6 de setembro de 2016

Porta aberta

Abri a porta, ainda sem a certeza absoluta de a querer já abrir. Para a poder abrir totalmente ou fechar, ou pelo menos saber que caminho percorrer, tenho de estar informada, conhecer as estatísticas, rever casos semelhantes, absorver artigos científicos sobre o dito cujo. Aprender para saber ouvir e discutir sobre o assunto. Em breve, consulta da especialidade e segundas opiniões, claro.

Bora lá, que para a frente é o caminho, ainda um bocado a medo, mas indo.


Beijinho,
Vera

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Os chamados desafios!

Comecei por ver imensas fotos no facebook a preto e branco...não percebi o intuito, mas também não questionei. Vê-se por lá tanta coisa estranha, que uma foto a preto e branco em nada me tocou. Nenhuma me tocou, mesmo quando me apercebi que era uma espécie de alerta contra o cancro...fiquei insensível talvez. Muita quimio e radio neste corpinho para ligar a essas pseudo-campanhas de alerta.

Apenas uma foto me fez parar e admirar a coragem. A Rachel, uma mulher com cancro inflamatório da mama que faz parte dos mesmos grupos de apoio que eu "frequento", e que simplesmente se colocou a preto e branco, tal como ela é, tal como o cancro a deixou.

Tão simples quanto isto...chega para alertar os mais distraídos?
Se não chega, leiam as palavras dela.



"Challenge accepted! You want a "cancer awareness campaign"? Here, have this. Everyone is aware of cancer. Telling people where you keep your handbag, what colour your pants are, or writing some cryptic status like "used my boobs to get out of a parking ticket" isn't going to raise anyone's awareness (..) And the latest craze is a black and white photo. How the hell does that raise awareness or raise funds for research? By all means, let's try and have some fun whilst we raise awareness (anyone who knows me knows I have always tried to see the positive or humorous side of things) but it's not just "awareness" - everyone needs to be aware of the signs of cancer and to check themselves regularly. I know the people doing these statuses and pictures have good intentions, so I'm not attacking anyone who has done them. By all means join the "don't forget to check" Facebook group so you get monthly reminders to check your breasts. Set yourself an alarm on your phone. Check every time you're in the shower. Familiarise yourselves with all the symptoms... not just a lump but also a rash, a swelling, a redness, a pain. By all means share this "black and white no make up selfie" of me showing what happens if you have to have a mastectomy. Maybe that will make people check. Maybe that will encourage people to donate. Having cancer isn't fun. Having cancer isn't brave. Having cancer isn't a picture you can post and then hide behind. It's horrible, it's a killer, and it's something we do all need to be aware of in the right way."

Beijinho,

Vera


quinta-feira, 14 de julho de 2016

Benditos chineses


Foi à conta dos chineses que me esqueci do meu marcador tumoral. Em 2 anos, nunca me tinha esquecido de ver resultados de análises, nem nunca me tinha conseguido esquecer dos resultados. Há uma primeira vez para tudo…até para o CA 15.3.

No dia 1 de julho fui ao meu oncologista e fiz alguns exames. Com as ecografias, não crio grande ansiedade, porque é percetível se está tudo bem e o médico logo me diz “Tudo perfeito, dona Vera. Até daqui a uns tempos”. Já com o marcador, não é bem a mesma coisa. Demora, pelo menos, 24 horas a sair o resultado e por norma, abro o relatório das análises e corro até ao último item para ver este “indicador de bicheza”.

A semana passada foi tão agitada que me esqueci de aceder ao portal do utente para ver os resultados… uma dúzia de chineses, ensaios de hip-hop, charmoso ocupado e mais umas coisas na vida do dia-a-dia… bye bye cancer. Sem espaço na memória física para ti.

Mas sim, continua tudo bem. Marcador tumoral estável e baixinho, como se quer para todo o sempre. A única surpresa desagradável é, novamente, a vitamina D pelas ruas da amargura. Preciso de sol, já que mesmo com suplementos, não chego sequer aos minímos recomendáveis para um adulto normal. Hoje fiz um pouco de fotossíntese no mini-intervalo para almoço e depois do trabalho fui até à praia com a minha filhota aproveitar o resto do sol e da maresia (sim, eu sei que a partir de uma certa hora e com determinada inclinação dos raios de sol, já é quase em vão a exposição ao sol para efeitos de vit. D, mas sabe-nos bem na mesma).

O pai charmoso juntou-se a nós mais tarde, mas ficou-se pelo passadiço de madeira na Vagueira, enquanto nós fazíamos bolos de areia molhada e colhíamos conchas. Como é fácil ser feliz com tão pouco:)

Bjinho




sexta-feira, 17 de junho de 2016

2 anos

Já cá estou, atingi uma primeira meta de 2 anos pós-cirurgia. Em breve, 2 anos pós-tratamento choque...serão 3 para o ano, depois 4, 5, 6 e por aí em diante.

Fé, esperança e alegria de viver, de mãos dadas com a vida.

Beijinho :)

Vera

sábado, 11 de junho de 2016

Por passos de bebé.


Alertaram-me, esta semana, para o facto de eu não escrever nada no blog há muito tempo e perguntaram-me se estava tudo bem. O blog serve para isso mesmo, para que acompanhem a história, ou mera estória provavelmente.

Tem estado tudo bem comigo e com os da família, com trabalho e serenidade. Há dias de azáfama, dias mais calmos, dias para todos os gostos.

Em breve, chegará um dia que me marcou…nesse dia, faz anos o meu afilhado mais velho, mas foi também o dia da cirurgia. Fará 2 anos que fiz a cirurgia, que mandei para análise uma parte do corpo que já não sentia minha, que eu já não queria e que me podia privar de estar aqui a escrever.

Este mês, depois de bastante ponderação, abri, na minha cabeça, a porta da reconstrução. Depois de luz semi-verde por parte do oncologista, porque apenas em setembro se completam 2 anos após radioterapia, começamos a pensar nesse processo. Uma primeira consulta de cirurgia já me pôs a pensar nas hipóteses, trouxe os papéis para os exames necessários, vi e ouvi o que a minha cirugiã me disse, mas ainda não quero a consulta com o cirurgião plástico (passo 2).

Porquê adiar o segundo passo? Por tudo e mais alguma coisa…porque ainda não completei 2 anos após fim de tratamentos choque, porque tenho pavor a estar outra vez dias e dias sem tomar banho no verão, porque tenho medo, porque vai doer, porque ainda não sei que decisões vou tomar a nível de profilaxia, porque vai doer (repetido intencionalmente)...mas acima de tudo, porque a minha filha entra na escola primária em setembro. É um passo importante na vida dela, um marco de vida em que eu quero estar presente e quero que ela tenha uma mãe minimamente activa nessa altura. Quando for operada, provavelmente tenho de voltar a recorrer à minha mãe para assistência ao domicílio e ao Nuno para motorista privado e, diga-se de passagem, nunca gostei muito de estar dependente.

Depois disso, depois de ultrapassadas as outras questões e depois de eu própria saber o que pretendo com este passo, aí sim, vamos lá plastificar.  Até lá, estou bem, feliz e a viver os dias com alegria. Continuo assim, como sou e como o cancro me deixou. Mas acreditem, eu deixei-o bem pior :)

Beijinho
Vera

Ps. Que finalista de pré-escolar linda que eu tenho:)

segunda-feira, 16 de maio de 2016

Fase rotineira

Há dias em que me consigo esquecer do cancro e levo uma vida normal, entro na rotina despassarada de escola, trabalho, casa, lava roupa, arruma roupa e desatino com as mais pequenas coisas....sim, imagino que o normal de todas as pessoas.

Houve dias, no meu annus horribilis de 2014 em que eu dizia a mim mesma que nunca ia voltar a ter dias assim, de rotinas parvas que nos emudecem e adormecem o espírito. No entanto, à medida que o tempo passa e o "território" conquistado ao cancro vai aumentando, voltam velhos hábitos.

Por um lado, é altamente gratificante que assim seja. É sinal de que o cancro não voltou e que eu estou viva, apesar das mazelas físicas e das outras menos físicas:) Mas, por outro lado, às vezes chateio-me por cair na rotina tão facilmente, por ceder tão rapidamente à "vida" corriqueira, sem por vezes me dar conta que saio do trabalho, vou buscar a Rita e vamos para casa fazer jantar, banhos, etc...

Ontem fomos com ela à praia de manhã, com o tio Nelson e o charmoso. Estava um sol fantástico na Vagueira, apesar do vento. O meu termoestato ainda se encontra avariado, sentia algum frio, mas a Rita até na água chapinhou...! Andávamos nós de rabo para o ar a apanhar conchas quando ela descobre um búzio...a cara de felicidade dela fez o meu dia. É disto que nós todos precisamos, de encontrar um búzio. Para ela, uma espécie de tesouro, uma felicidade tal que saltava de alegria na praia.

Conseguíssemos nós, adultos, ficar tão felizes com tudo o que temos e havia menos caras sizudas e mais alegria de viver. Dizem que só damos valor à vida quando esta está em risco....porque não fazer isso antes?

Beijinho,
Vera

domingo, 17 de abril de 2016

A "nutella"

Cada vez que olho para as lista de ingredientes das supostas "comidas" para crianças, dá-me arrepios. Entupimos as crianças de açúcar. Depois de deixarem o leite materno, começamos pelas papas, ou como já ouvi falar uma vez, a farinha de engorda das crianças. Não, não sou perfeita. A minha filha também as comeu, e ainda come atualmente cereais com leite, se bem que eu é que escolho os cereais.

Com uma maior consciência dos alimentos que ingerimos, vem também mais trabalho para nós. Na sexta à noite fizémos iogurtes, ontem fizémos a nutella. Mas sabem bem, e a Rita ajuda nestas tarefas com gosto e vai ganhando consciência que devemos optar pelas coisas mais simples e melhores, o que não é necessariamente mais caro.



A nutella, por norma, encanta miúdos e graúdos. E sim, a nutella feita em casa não é igual à nutella que se compra. E ainda bem que assim o é. A nutella feita em casa não leva porcarias, óleos estranhos, açúcares escondidos com nomes de coisa fina. Não fui eu que inventei a receita. Fui inspirar-me para a receita  a um outro blog De Sedentário a Maratonista, que por sua vez também já se tinha inspirado noutro blog. Não há necessidade de re-inventar a roda.


Receita:
2 cups (+/- 250ml) de avelãs
1/2 cup de mel

3 colheres de sopa de cacau cru em pó
água 



Torrar as avelãs no forno a 180ºC durante aproximadamente 10 minutos. Depois tirá-las do forno e deixar arrefecer. Assim que estiverem frias, triturem-nas bem num processador (ou uma Bimby), até estarem totalmente moídas. Depois juntem o mel, o cacau e misturem de novo, antes de gradualmente irem adicionando a água. É importante que adicionem a água só depois de misturarem bem os primeiros ingredientes, pois até podem não necessitar da água.

 Fonte: De Sedentário a Maratonista

Ora, da minha experiência em não seguir receitas à letra, eis os meus comentários:

- Costumo usar 100gramas de avelãs (o que custa mais ou menos 2 euros) e dá a quantidade do pote da fotografia.  Aguenta-se uns 15 dias, por isso não vale a pena fazer muita quantidade.

- Apesar de  receita original não mencionar, se usarem avelãs com casca, têm de as descascar. O sítio mais barato onde encontro as avelãs é na zona de "granel" do jumbo, mas é preciso estar atento porque têm muitas amêndoas misturadas...e pagamos amêndoa ao preço da avelã :)

- Para descascar a avelã, é só levá-las ao forno os tais 10 minutos, depois embrulham num pano de cozinha e vão "mexendo" até a maior parte das cascas saírem. O resto tirem "à lá pate"...

- Considerem o tamanho das avelãs. Se forem mais pequenas, não deixem tanto tempo no forno. Elas vão ao forno para lhes conseguirmos tirar a casca e para depois "libertarem" o óleo, mas se torrarem muito, pode dar um travo a torrado no final.

- O mel é importante, porque é ele que vai dar o tom adocicado. Como eu usei um mel verdadeiro, da Serra da Freita, que é forte mas pouco doce, acrescentei uma colher de açúcar mascavado no fim.

- Uso cacau magro, quase "puro", por isso vou acrescentando aos pouco, porque é muito forte.

- Usei a minha yammi (=bimba dos pobres) para fazer a nutella, mas acho que qualquer processador de alimentos serve.

No fim, o comentário da Rita a lambusar-se foi: "mamã, esta nutella está deliciosa."
E não preciso de mais reviews, basta-me o dela!

Bjinho,
Vera




segunda-feira, 11 de abril de 2016

Ai a rotina, a malfadada rotina

Há dias em que caio na cama cansada e frustrada...24 horas dá para fazer tanta coisa, para viver tantas coisas diferentes, mas há dias em que parece que não fazemos nada de útil. As horas esfumam-se, vemos os relógios acelerarem e as nossas baterias a baixarem gradualmente na execução das tarefas...e assim, em nada,  se volta a cair na cama, de onde não nos apetece sair de manhã.


Talvez seja apenas da mudança de estação, da falta do sol e da vontade de calçar as havaianas, mas tenho andado a perder baterias mais depressa do que gostaria. É ter a vontade de fazer as coisas, mas o corpo responde à velocidade de um caracol...é querer escrever e não sentir vontade de estar no computador à noite, é querer começar projetos pessoais e adiar consecutivamente...

Até este blog tem sofrido, coitado. Ando há séculos para:
- falar da sorte ou azar no cancro, basicamente desde que saiu um artigo na Science acerca do factor "azar" no cancro;
- falar acerca do que eu acho que contribuiu para o meu cancro:
- retratar aqui melhor as mudanças que fiz na alimentação;
- falar do que tenho feito para abrandar a osteopenia;
- falar das aventuras da minha filha de quase 6 anos;
- falar da reconstrução mamária;
- falar de cancro e da vida pós-cancro.

Porque afinal de contas...há vida depois do bicho, caramba!
O raio da rotina instalada é que não nos deixa viver...eheheheeheh. A malfadada rotina dá cabo de nós...horas para isto, horas para aquilo, trabalhar, comer, dar banho, tratar da casa, dormir, acordar, comer, trabalhar...

Enfim, nada que uma pessoa normal não compreenda e não sinta. Resta saber é como ser feliz e sorrir, mesmo no meio da rotina instalada.

Bjinho,
Vera





segunda-feira, 14 de março de 2016

577

Hoje publiquei no facebook o endereço do mapa da Terry...faço parte desse mapa. Sou uma pequena mancha verde, o nr. 577. Felizmente estou verde = NED (No Evidence of Disease).

É impressionante o trabalho que esta mulher norte-americana faz. Diagnosticada em 2007 com cancro inflamatório da mama (IBC), tem dedicado todo o seu tempo a uma causa maior: IBC Network Foundation. Visa alertar e chamar a atenção da comunidade para este tipo de cancro e, via angariação de recursos, financiar investigação científica nesta área específica. 

O meu primeiro contacto com a Terry decorreu a meio da minha quimioterapia. Na minha busca por mais e melhor informação, encontrei informação acerca dela e do trabalho que ela fazia em articulação com centros de investigação de alto nível nos EUA.

Contactei-a primeiro por email, depois facebook e agora sou uma delas. Portuguesas, espanholas, francesas, belgas, alemãs...somos muitas europeias a juntar-se a muitas mais americanas e outras nacionalidades. Conversamos, trocamos ideias, opiniões acerca de tratamentos, de novos ensaios clínicos, etc., mas também debatemos a parte humana, a mulher que sofre, os divórcios, as desilusões, o medo, os filhos, as frustrações pós-tratamento, etc.  

Este mapa resulta de um esforço dela para demonstrar que, se houvesse informação concertada, então o cancro inflamatório não seria assim tão raro como dizem. Desconhecido pela maioria até na comunidade médica, sim…isso sim e eu própria o experienciei no primeiro hospital que me recebeu.

Partilho o mapa em que apenas eu figuro no nosso país, mas pessoalmente já contactei com, pelo menos, mais três mulheres com IBC. Que sirva para passer uma simples mensagem: não é preciso ter um caroço na mama para ser cancro. No lump, still cancer.


Façam os auto-exames, aprendam a reconhecer os sinais que o vosso corpo transmite.
Beijinho
Vera

Mais informação em https://www.theibcnetwork.org

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

A 'osteocoisa'

Chegaram os resultados dos exames há mais ou menos 3 semanas. Depois da queixa das dores no peito, e tendo em conta que já faço hormonoterapia há mais de 1 ano, a densitometria óssea foi mesmo necessária e revelou já sinais de osteopenia localizados em dois sítios do meu esbelto figurino.

Esta sexta-feira passada já discuti com o meu oncologista os resultados. Era, mais ou menos, de prever que isto acontecesse, até porque já tinha alguns antecedentes de "fraqueza" nos ossos (=reumatismo). Confesso que o nome me levantou alguma desconfiança assim que recebi o relatório, mas depois de bem googlado, entendi em que estado estou em termos de esqueleto.

Nos casos em que a paciente foi diagnosticada com osteopenia e faz inibidores de aromatase, como eu, é recomendável, de acordo com a a literatura, o consumo de suplementos de cálcio e vit. D e o meu oncologista já me prescreveu uma porcaria efervescente que é doce e enjoativa para tomar depois de almoço e depois de jantar...yek, yek, yek! Como eu adoro comprimidos :)

Por outro lado, há outras abordagens mais alternativas, que podem complementar o suplemento, ou eventualmente substitui-lo... Exercício físico regular, alimentação rica (e sem leite de vaca ou derivados no meu caso) e cuidado com as quedas. E claro, continuo com a acupuntura...as agulhas mostraram-me que é possível combater certas coisas sem medicamentos e tem sido uma boa aposta.

Não posso dizer que tenha ficado muito abalada com a osteopenia, até porque já estava, mais ou menos, consciente que a medicação ia provocar os seus efeitos secundários mais cedo ou mais tarde. Enquanto for assim, estamos bem! Entretanto, se me virem a andar de elevador, relembrem-me que há escadas até ao 3º andar, mas com jeitinho! 

Bjinho
vera


quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Dia do sapato de casamento

Todos nós temos um par de sapatos de casamento, aqueles que correm as festas dos outros, os eventos mais exigentes e para as alturas em que queremos estar melhor "apresentadas". Hoje foi um dia desses. Saíram de casa após meses na sapateira e a única conclusão a que chego é a seguinte: Como raio consegue alguém andar de saltos diariamente?

Brincadeirinha à parte, é nestes dias que eu consigo aperceber-me como o cancro me tornou mais calma. Num dia de apresentação de um projeto, muito passível de me tirar do sério há uns tempos atrás, eu até andava zen até quase ficar sem opções para projetar. Prefiro, sem sombra de dúvidas, trabalhar com a Apple, mas hoje problemas na projeção quase, quase me fizeram implorar por um PC :)

Quando passamos por um cancro, ou por uma outra qualquer provação, juramos a nos próprios que nunca mais nos vamos chatear com miudezas, vamos deixar de nos irritar com quem nos irrita, vamos deixar de nos abalar com picuinhices, etc, etc...mas depois, entrando novamente na vida real, é difícil controlar e fazermos uma vida à parte. Dou por mim muitas vezes a pensar como reagiria a uma dada situação há 2 anos atrás e como quero reagir atualmente. Isso permite acalmar muita da ansiedade, controlar o stress e manter alguma sanidade mental perante os imprevistos, tentando sempre manter a boa disposição.

Continuo a achar que anda meio mundo chateado com outro...mas eu prefiro continuar a sorrir para ambos, enquanto me deixarem.

Beijinho, sejam felizes e usem sapatos rasos...



quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Catrapumbas

Há dias em que a mais pequena coisa nos consegue chatear e carregar o nosso corpo de stress oxidativo e energias negativas. Todos temos esses dias em que sentimos a fatalidade das coisas. Caímos, levantamo-nos e vamo-nos equilibrando, tentando não cair e não tropeçar. Mas a vida é mesmo feita disso e catrapumbas... lá estamos nós num rodopio novamente. Ora estamos bem, ora mal, ora remediados. Há uns melhor, uns pior e outros na mesma mó. E depois há os que julgam ter, os que julgam poder, os que julgam controlar a vida. Que vã ilusão.

Tenho-me deparado com tantos casos de cancro à minha volta em pessoas que não fazem mal a uma mosca. E depois vejo pessoas más, ruins a quem nada acontece e vivem felizes com o mal-estar alheio....ah injustiça. Houvesse alguma forma de mandar e era nesses em quem recairiam as doenças e as coisas más desta vida, e não em crianças pequenas ou noutros seres inofensivos.

Vou colocar o meu azedume de hoje na cama...pode ser falta de descanso.
Bjinho
vera

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

A cabeçada simpática :)

Na semana passada repeti o modo "exames e mau humor". Na sexta-feira, lá fui eu, qual maria segura e formosa para o Hospital da Arrábida. Sou sempre recebida com um sorriso, aliás, vários sorrisos que me fazem sentir mais do que uma cliente, sinto-me "acarinhada" pela equipa que já me acompanha há 2 anos. As minhas visitas mensais começam sempre na Licínia, que sempre simpática e afável, trata de toda a parte de registo e entradas, com um sorriso sempre pronto. É fácil criar empatia por profissionais assim. Obrigada pela constante simpatia.

Esta sexta-feira a rotina foi alterada. Primeiro fui fazer alguns exames para verificar o "status quo". A segurança que tenho vindo a ganhar andava meia esbatida, com uma persistente dor no peito desde há alguns dias, bem perto da zona irradiada. Claro está que não comentei com ninguém, porque sempre tinha de ir a consulta na sexta já via a dor com o oncologista, o meu querido anjo da guarda.

A dor, quase mais em tom de incómodo do que propriamente dor, era só, repito só, quando respirava. O resto do tempo estava bem...mas quando me deitava parecia que tinha alguns quilos em cima da caixa torácica. O que passa na cabeça de um doente oncológico com estes sintomas? Ahahahaha...não queiram imaginar.

O Raio-X ao tórax não mostrou nenhuma costela fraturada, nem o esterno, nem nada "quebrado". Como o meu médico da imagiologia me disse em tom de brincadeira, só se notou a ausência da mama, o resto está tudo bem. Perfeito!

Em conversa com o meu querido oncologista, depois de excluídas as hipóteses de fratura, passamos à exclusão de potenciais causadores dessa dor...teria eu esbarrado contra alguma coisa, batido com alguma coisa no peito....uhm....lembrei-me de uma cabeçada da Rita e das estrelas que vi nesse momento. Raios partam, porque raio não me lembrei eu dessa cabeçada antes...teria evitado umas quantas divagações.  Pois, terá sido essa cabeçada que me pisou e fazia esse "aperto" ao respirar. Entretanto, a sensação foi-se diluindo e estou quase normal.

Fiquei a saber nesta consulta que é comum haver costelas rachadas no período pós-radioterapia, uma vez que os ossos podem ficar fragilizados. Evitar cabeçadas daqui para a frente!  Como o assunto dos ossos veio à baila, depois do Raio-X, da ecografia abdominal e das análises ao sangue, ainda fui fazer a minha primeira densitometria. A hormonoterapia pode provocar a descalcificação, por isso há que vigiar para evitar males maiores.

Foi assim esta minha revisão mensal, animada e pacificadora de mentes.


Na acupuntura a estimular o meu sistema imunitário)

Bjinho,
Vera

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Datas e o Smeagol

Datas...coisas tão básicas numa história.

Faz amanhã 2 anos que fiz a primeira sessão de quimioterapia. O dia 8 de janeiro é, provavelmente, uma data que me vai acompanhar para sempre, mas para efeitos de contagem de anos pós-cancro, conta outra data, a do fim dos tratamentos-choque, no meu caso coincide como fim da radioterapia a 19 de agosto.

Num dia em que fomos bombardeados com imagens de uma atriz portuguesa a rapar o cabelo, tive de fazer um esforço para me recordar quando tinha rapado o meu. Bendito blog que mo relembrou. 4 de fevereiro quando o meu irmão e a Risy quase me arrancaram o escalpe e expuseram o meu crânio imperfeito. Além de quase careca (havia uns resistentes, tipo kiwi), tinha (e tenho) uns quistos na cabeça que não me permitiam passear a careca à vontade. Ainda era confundida com o Smeagol (o "my precious" do Senhor dos Anéis, conhecem?).




Vi alguns comentários nas notícias acerca desta atriz e do gesto, ora em tons de elogio e de encorajamento, ora de crítica. Também eu fui criticada por escrever este blog e nem por isso o deixei de escrever. Disseram-me que me estava a expôr demais, uma das vezes. Talvez até o tenha feito, mas se calhar precisava de o fazer. A censura devia ter sido abolida com a ditadura, mas sabemos que não é bem assim. Cada um faz com o seu cancro e a sua vida o que quer e bem lhe apetece. Caramba, já nos basta a porcaria do cancro, não?

Se uma figura pública, e nem questiono se tem estatuto para ser assim chamada, pode ser útil para chamar a atenção para esta doença, então que o seja. Que as mulheres olhem para ela e consigam imaginar-se na pele dela. Talvez assim façam os auto-exames de palpação, façam as ecografias de rotina e aprendam a reconhecer os sinais do seu corpo.

A parte do corte do cabelo não me impressiona muito, nem agora, nem antes da minha vez. Mas nós somos todos diferentes. O cabelo e a sua importância são relativos. O que para uns é muito fácil, para outros pode ser um drama. Cabelo é cabelo, mas imaginem-se sem ele. Imaginem verem-se ao espelho de manhã e estarem carecas, de olheiras e amarelos...é isto que a quimioterapia nos faz.

Penso que, no fundo, não é a ausência de cabelo que aflige ou faz chorar. É simplesmente o significado dessa ausência. É ser obrigada a reconhecer que temos cancro sempre que passamos a mão pelos cabelos ausentes. É sentir o frio nas orelhas e na cabeça quando nos deitamos. É sentir que estamos diferentes e somos olhados como diferentes.

Não custa perder o cabelo, custa, isso sim, ter cancro.
O cabelo volta a crescer, seja encaracolado, carapinha, liso ou num nó. Ele volta, porque a vida também volta, porque vencemos o cancro, porque queremos viver.

Bjinho
Vera





sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

2016

Já estamos em 2016...ontem brindei com o meu charmoso à vida e relembramos a nossa passagem de ano de 2013 para 2014!

Há 2 anos atrás, tive de fingir que estava tudo bem no Natal e Ano Novo...claro que estava tudo bem. Só tinha um cancro a crescer dentro de mim, tirando isso estava ótima:)

Olhava para a Rita e dava-me vontade de chorar, mas tirando isso, estava tudo bem. Sentia o cancro a crescer, conseguia sentir a diferença de semana para semana. O medo consegue fazer-nos parar no tempo, consegue fazer-nos ter visões horríveis. Imaginar os nossos filhos a crescerem sem nós é qualquer coisa anti-natura. Mas a nossa mente consegue fazê-lo.

Mas depois de 2 anos, ontem tivémos uma santa passagem de ano...e sabem, a minha foi tão santa que eu estava a dormir quando se deu. A Rita já cambaleava pelas 22h30. Fui deitá-la, li uma história de piratas e fiquei ali juntinho dela até ela adormecer...ela e eu, está claro. Acordei à meia noite e uns segundos com um beijo do charmoso, em mim e na filha.

As nossas passagens do ano são assim, provavelmente uma seca aos olhos de muita gente, mas para nós, têm significado assim. É um dia normal, só muda a ementa, que estava mais "elaborada". Abri uma boa garrafa de vinho que uma certa loirinha me ofereceu para desfrutar com quem mais amo...e assim foi. Desfrutei sozinha, porque o charmoso não bebe álcool, mas os pequenos prazeres da vida também se podem saborear assim.

Espero que 2016 traga saúde para todos e no meu caso que se mantenha :)

Sejam felizes, menos picuinhas e menos egoístas. Anda meio mundo a tentar lixar o outro meio e quando se aperceberem que a vida é curta, talvez já seja tarde.

Aproveitem o dia de hoje para serem felizes com a vossa família e amigos.

Aproveitem simplesmente a vida.

Beijinho
vera